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Depois de Tio Vanya, Bruno Bravo regressa a Tchékhov com Três Irmãs

Por

 

Pedro Mendes
2 de Julho de 2025

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Depois de Tio Vanya, Bruno Bravo regressa a Tchékhov com Três Irmãs

Depois de "Tio Vanya", Bruno Bravo regressa a Anton Tchékhov com "Três Irmãs", em cena no CAL – Centro de Artes de Lisboa. O espectáculo, apresentado pela companhia Primeiros Sintomas, volta a mergulhar no universo denso e subtil do dramaturgo russo, desta vez explorando o desejo de fuga, a espera por um futuro que nunca chega, e a melancolia de uma geração suspensa entre promessas e frustrações.

Nesta conversa, Bruno Bravo fala do amor antigo por Tchékhov, da tradução feita especialmente para este espectáculo, da relação íntima com o elenco e da relevância intemporal do texto. Com uma encenação que privilegia a liberdade dos actores e uma leitura atenta das camadas psicológicas das personagens, "Três Irmãs" revela-se, nas palavras do encenador, uma peça que continua a ressoar profundamente num presente marcado pela incerteza, pela guerra e por uma crescente nostalgia de um futuro idealizado.

O que te levou a regressar a Tchékhov depois de “Tio Vanya”?

O amor que tenho por Tchékhov e o desejo de poder, eventualmente, levar a cena, com os Primeiros Sintomas, as quatro peças principais que compõem o cânone da sua obra dramática. 

O que te fascina mais nesta peça tão presente no cânone do teatro?

Esta peça é, evidentemente um clássico do teatro. A Gaivota, O Cerejal e Tio Vanya, também. Não é possível distingui-las medindo o grau de grandeza de cada uma.  São as quatro absolutamente diferentes e estranhamente iguais. Há sempre uma mesa, um samovar, personagens que parecem viver entre nós. Em Três Irmãs fascina-me a ideia de fuga, não se sabe bem para onde. Moscovo, para onde as três irmãs querem, desesperadamente, ir, para fugir à vida da cidade de província czarista, onde a ação se passa, é uma ideia, a metáfora de uma vida melhor, mas também o regresso a um tempo onde já não é possível regressar, o sítio onde habitavam na infância. É, também, a fuga para um futuro, irrealizável, onde a vida poderia, enfim, fazer um sentido mais pleno. Depois são três raparigas rodeadas de soldados. Soldados, aparentemente, sem guerra.   


De que maneira a tua tradução e encenação procuraram tornar “Três Irmãs” apelativo para o público atual?

Quando comecei a traduzir a peça, exclusivamente para o espectáculo, a partir de versões francesas e inglesas, dei conta que, na realidade, não lemos muitos dos autores que mais amamos. Não sei Russo. E no caso de tantos outros, nem grego antigo, nem sueco ou norueguês. Mas Tchékhov é permeável a tudo, ou quase tudo. É sempre novo porque, precisamente, é permeável a escolhas e interpretações várias. É o autor mais concreto e mais abstracto que conheço. As frases podem ser, constantemente escavadas. No decorrer dos ensaios estamos constantemente a descobrir coisas, e agora durante a temporada tenho a certeza que continuará. A peça é uma coisa e qualquer espectáculo será sempre outra, inteiramente diferente.

Qual foi o entendimento que fizeste do desejo de fuga e esperança que move as três irmãs?

Como disse atrás o desejo das três irmãs de partirem para Moscovo é central nesta peça. Esse desejo pode ser interpretado de várias formas. Na época o inicio da industrialização na Rússia transformou Moscovo o eixo da modernidade num país sobretudo rural. Sabemos que com a industrialização também veio o trabalho escravo e as condições lúgubres dos trabalhadores que inundavam as principais cidades industrializadas. Há uma constante referencia nesta peça (noutras do Tchékhov também) ao desejo de trabalhar. Irina, a irmã mais nova, arranca com esse desejo, quase ideológico, o primeiro acto, mas rapidamente se apercebe de como é dura a vida de um trabalhador. Ir para Moscovo funciona na peça como uma ideia de espécie de paraíso onde a vida poderá ganhar um sentido novo, de paz, de futuro, de garantia, de afecto, de amor. Sabemos que esse sítio não existe. E este é um dos elementos trágicos da peça. As três irmãs estão encurraladas numa cidade de província que pode muito bem ser o mundo.

Como trabalhaste com o elenco para revelar as subtilezas psicológicas tão características de Tchékhov?

O elenco é grande. Actores e actrizes que admiro muito. Trabalho com alguns deles há mais de dez anos, com regularidade. Outros pela primeira vez como o Marco Delgado (Verchinine). Já nos conhecemos bem. Este género de textos ganha se a direção for uma espécie de caminhada em conjunto, de mãos dadas. Deixar os actores o mais livres possível para poderem criar a sua interpretação das personagens.

Num momento tão marcado por mudanças e incertezas, achas que “Três Irmãs” ressoa de maneira particular junto do público actual?

Tchékhov já desapareceu, mas a sua obra dramática está ainda à nossa frente e assim continuará. Três Irmãs é uma peça que não acaba, levá-la a cena hoje será uma coisa, evidentemente diferente se fosse levada a cena há quatro anos, por exemplo. Mas a atualidade permanente é sempre devolvida ao público. É o público que julgará essa ideia de “atualidade”. Posso apenas dizer que, no final, a partida dos jovens soldados para outras paragens, no mundo como está hoje, com genocídios e a Europa a investir em armamento como não há memória, os jovens soldados de Tchékhov, alegres no fim, partirão para onde? É inquietante ver a flor da juventude partir com alegria para um futuro sombrio.

Qual a importância de representar uma peça com mais de um século no contexto do teatro actual?

Não sei se é importante. Acho que se olharmos para as peças de Tchékhov, como obras primas, e também esta em particular, podemos, com sorte, intuir nelas uma força vital, que nos distingue dos outros animais. É como a pertinência de ser ouvir, hoje, Mozart, Bach. Olhar uma pintura de Picasso. Ler a Guerra e Paz do Tolstoi. Depois, quanto mais distópico o mundo está, melhor hipóteses temos de encontrar consolo nos clássicos.  

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