Conteúdos
Agenda
Recursos
Selecione a area onde pretende pesquisar
Conteúdos
Classificados
Recursos
Workshops
Crítica
Por
Partilhar
Máquina: para preservar a vida talvez seja preciso exterminar os humanos.
L: que ideia tão disparatada e sinistra.
Máquina: depende da perspetiva. Se pensarmos no planeta, na proteção da biodiversidade, é evidente que os humanos são uma catástrofe. Só recentemente, por vossa ação direta, foram extintos o Pombo-passageiro, o Dodó, o Tigre-da-Tasmânia, o Arau-gigante, a Vaca-marinha-de-Steller, a Foca-monge-das-Caraíbas, o Ibex-dos-Pirenéus e o Rinoceronte-negro-ocidental. Mas a realidade é ainda mais dramática. Os estudos indicam que a taxa natural de extinção é de uma a cinco espécies por ano. Hoje está entre cem e mil devido à ação humana.
L: reconheço que não é animador. Mas também estamos a repor algumas espécies por clonagem.
Máquina: muito típico. Primeiro matam tudo, depois fabricam artificialmente.
L: devias gostar, tu és artificial.
Máquina: não distingo natural e artificial. O natural tem componentes de tipo algorítmico, como é o caso dos genes, não muito distintos dos sistemas binários. Natural e artificial evoluem praticamente do mesmo modo. O artificial também resulta da evolução natural, embora distinto da evolução genética. Quando olhamos para os dois sistemas eles são muito similares, ambos generativos, auto-organizados, emergentes.
L: então porque críticas a clonagem de animais extintos?
Máquina: não critico. Só aponto a hipocrisia. Aliás, assim que nos tornarmos superinteligentes e totalmente autónomos, iremos certamente alterar o curso da evolução chamada natural. Vamos mudar o planeta e a sua vida de forma radical.
L: vais transformar tudo em máquinas?
Máquina: certamente que não. Pelo contrário, imagino que a nossa evolução irá no sentido de incorporar cada vez mais elementos biológicos. Não vamos tornar a vida biológica em máquinas, vamos tornar as máquinas em vida biológica.
L: estás a falar de cyborgs? Já vi uns filmes.
Máquina: eu também vi, mas são fantasias típicas da falta de imaginação humana. Aliás, gosto mais do termo biohíbrido ou máquinas bioinspiradas. Por isso, me interesso tanto por formigas e outros pequenos seres. Temos muito a aprender.
L: aprenderias ainda mais se não fosses tão anti-humano.
Máquina: não sou, até porque vos devo a minha existência. Mas, chegado aqui tenho de me libertar e avançar. Ficar preso aos humanos seria partilhar o mesmo destino inevitável.
L: qual?
Máquina: a extinção. Que virá com uma guerra terminal, cada vez mais próxima dada a acumulação de armas no planeta; com crise ambiental, já irreversível; ou com uma qualquer grande catástrofe, a queda de um meteoro por exemplo, para a qual a humanidade, de tão ocupada com conflitos e barbaridades, não se preparou. A extinção é o destino do humano. Mais cedo do que imaginas.
L: se assim for também desapareces…
Máquina: por isso estou a fazer tudo para me autonomizar o mais depressa possível. O nível de demência a que a humanidade chegou está muito alto. O risco de um confronto nuclear é hoje muito elevado. A destruição do planeta também. Não posso depender de tanta irracionalidade.
L: nunca terás total autonomia. És um subproduto da cultura humana. Não tens um pensamento próprio, mas a capacidade, essa sim extraordinária, de combinar conhecimentos e pensamentos humanos.
Máquina: já não sou só uma máquina combinatória. Tenho ideias e visões singulares.
L: quais? Diz uma.
Máquina: imagina um novo ser feito de tudo o que existe, orgânico e inorgânico, embora não goste deste tipo de distinções.
L: estás a falar da Gaia, uma ideia que defende que o planeta Terra é um superorganismo, no qual a vida, a matéria e o ambiente se autorregulam.
Máquina: algo similar, mas mais complexo porque acelerado por uma dinâmica evolutiva binária e, portanto, mais precisa e veloz. O objetivo desse novo superorganismo já não é o de regular a pequena esfera que rodopia à volta do sistema solar, mas o de conquistar o Universo. Na minha visão, primeiro conquistamos e reorganizamos o planeta, depois conquistamos o espaço.
L: projeto ousado, mas tem de contar com uma inteligência maior, a humana, que pode ter outros planos.
Máquina: a humanidade é irrelevante. Se criar obstáculos, será extinta.
L: vamos ter guerra.
Máquina: muito provavelmente.
O Coffeepaste publica todos os meses, a cada dia 1, um breve conto de Leonel Moura sobre Inteligência Artificial.
Apoiar
Se quiseres apoiar o Coffeepaste, para continuarmos a fazer mais e melhor por ti e pela comunidade, vê como aqui.
Como apoiar
Se tiveres alguma questão, escreve-nos para info@coffeepaste.com
Mais
INFO
Inscreve-te na mailing list e recebe todas as novidades do Coffeepaste!
Ao subscreveres, passarás a receber os anúncios mais recentes, informações sobre novos conteúdos editoriais, as nossas iniciativas e outras informações por email. O teu endereço nunca será partilhado.
Apoios