O calendário de candidaturas: planeamento é meio caminho andado

Uma das maiores dificuldades que vejo, junto de companhias e criadores independentes, é a gestão do tempo nas candidaturas a apoios. Muitas vezes, a ideia existe, o projeto tem pertinência, mas a candidatura acaba feita à pressa, sem estratégia, porque “o prazo já está a acabar”. É um padrão que se repete e que fragiliza o setor.

A verdade é simples: planeamento é meio caminho andado. Quase todos os concursos públicos e privados têm uma regularidade anual. A DGARTES, por exemplo, divulga com antecedência o seu calendário de concursos, mas é importante ter em conta que, por vezes, surgem atrasos na abertura ou alterações de datas que obrigam a alguma flexibilidade. Ainda assim, conhecer este calendário permite ganhar tempo e estruturar melhor o trabalho.

Esse planeamento deve incluir não apenas as datas de abertura e fecho dos concursos, mas também os momentos internos de preparação. Há várias coisas que podem ser feitas com antecedência:

- Reunir a equipa para clarificar ideias e alinhar objetivos. Antes de pensar em formulários, é essencial que todos estejam de acordo: qual é a proposta artística, que impacto se quer gerar e para quem. Uma reunião inicial, ainda sem pressões de prazo, ajuda a consolidar uma narrativa forte e a definir prioridades realistas.

- Trabalhar num rascunho de orçamento base. Muitos projetos falham porque os orçamentos são montados em cima da hora. Ter uma grelha pré-preenchida, com rubricas típicas (honorários, produção, comunicação, logística), facilita a adaptação às exigências de cada concurso. Este exercício também ajuda a perceber desde cedo se a ideia é financeiramente sustentável.

- Mapear potenciais parceiros e iniciar contactos. As cartas de apoio ou de parceria não se pedem na véspera. Vale a pena identificar com antecedência quais as instituições, coletivos ou autarquias que podem estar interessadas e começar um diálogo. Estas parcerias dão solidez às candidaturas e podem abrir portas a novos recursos ou públicos.

- Organizar a documentação administrativa. Certidões atualizadas, relatórios de contas, estatutos ou declarações podem ser um pesadelo se só forem pedidos no último dia. Ter uma pasta (física ou, preferencialmente, digital) com estes documentos preparados evita correrias e garante que a candidatura não fica de fora por uma questão meramente burocrática.

Assim, em vez de correr contra o tempo, a candidatura nasce de um processo estruturado e com maior qualidade. Há vários exemplos de companhias que transformaram a sua relação com os apoios só porque decidiram organizar um calendário e preparar-se com antecedência.

A médio prazo, este exercício traz duas vantagens claras: aumenta a taxa de sucesso nas candidaturas e reduz a ansiedade de quem está sempre “em cima do prazo”. Como setor, precisamos de valorizar esta dimensão de gestão e planeamento tanto quanto valorizamos a criação artística. No fundo, é disso que depende a sustentabilidade dos projetos.

Foto: © Estée Janssens | Unsplash