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O demónio também se cansa

Por

 

Inês Pinto de Faria
17 de Novembro de 2023

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O demónio também se cansa

As ilusões pessoais que nos atraem pelo inferno de outro fazem com que o peso do nosso não seja único. Toda a luz do meio-dia é a segunda parte de A Trilogia do Sol, depois de Apocalipsis entre amigues ou simplesmente o dia, do artista Julián Pacomio. Nessa primeira peça, os corpos dos bailarinos são objetos de estudo que se alargam a toda a escala do movimento. Um espaço de liberdade para diferentes estados do corpo, da dança ao repouso. Já a segunda performance da trilogia, estreada no ET Fest em Montemor-o-Novo, surge da questão: e o que acontece a estes corpos quando abandonam a festa? O que vem depois do passeio no êxtase? 


Insinua-se, lentamente, a caída no abismo. 


Julián Pacomio procura pensar com outros. Ao reunir as suas referências artísticas e literárias às dos criadores Bibi Dória e Bruno Brandolino, integra parte da linguagem da peça La Burla e apresenta um resultado desta metamorfose. A estrutura da peça apresenta-se como um artigo de investigação. Inicia-se com uma defesa lenta e exaustiva em referências, como se o espaço ainda não fosse seu. Conquistado o espaço de pensamento, os corpos sonâmbulos entram em palco.


Apontam-nos as palmas dos pés. 


Na ressaca, em pleno meio-dia, os três performers encontram-se sob um sol mediterrâneo abrasador. Começa a siesta, e o calor transporta para a decadência das personagens em La Ciénaga, de Lucrecia Martel. É salientado o que se esconde, assiste-se à intimidade do sono e partilham-se memórias. São descritos cenários, as figuras mostram-se como corpos representativos do seu imaginário. Numa hora perigosa do sol criam-se mitos de insolações humanas que causam distorções espaciais e temporais que nos levam por um retrato de um inferno, curiosamente, longe da dor. Em sono anestesiado, isolam-se em imagens e delírios mitológicos.


Na sonolência do calor, os corpos vão-se movimentando e despindo até às entranhas ensanguentadas. Surge de uma vontade de encontrar outros lugares interiores, através de um momento singular oferecido por deus, o Sol. Para lhe aceder espera-se a hora zénite, um certo limbo de perigo, identificado pelo desaparecimento da sombra. E é nesse rasgo, como numa tela cortada de Fontana (reproduzida no chão de cenário), onde a violência e o sublime se misturam em portal de acesso aos demónios. 


A sombra volta e atravessa-nos. O ritmo torna-se frenético, nervoso. Em hipnose, entre a doença e a morte, entre a loucura e o erótico, é invocada uma voz que se transporta por aqueles corpos moribundos, até ao renascer do espírito canibal. Nunca se olham, mas consomem-se. Assistimos ao Inferno, o diabo está entre nós. A intensidade crua e quente supera a previsível violência e dor daquele lugar. Lúcifer prefere divertir-se. Estes artistas também.


Como um demónio, súcubo, a ocupar o sonho da sesta, em atalho pelo canto das sereias, somos encaminhados ao pesadelo. Aqui procura-se o obscuro em plena luz do dia. Ultrapassa-se a linha de sal marcada no chão, chega-se ao outro lado por um marco temporal, e tudo acaba; mas antes, desfrutamos ainda de um último momento de sossego. “Y tú me dices: espera, espera, espera-me un segundo más.” 


O Seminário de Escrita Crítica para Artes Performativas, orientado por Rui Catalão, decorre nos dois fins-de-semana do ET/FEST, festival onde são apresentados os projetos vencedores das Bolsas de Criação d'O Espaço do Tempo, com o apoio do BPI e da Fundação "la Caixa", em Montemor-o-Novo. No primeiro fim-de-semana, nos dias 10 e 11 de novembro, os participantes tiveram a oportunidade de assistir às estreias absolutas de Que Seria, de Lara Mesquita, e Toda a luz do meio-dia, de Julián Pacomio.


Foto: Aline Belfort

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