Exposição
29 de setembro até 20 de dezembro de 2025
Cisterna do Colégio do Espírito Santo - Universidade de Évora
9h às 17h30 (dias úteis)
Dia aberto na Universidade de Évora:
29 de setembro
17h - Inauguração de Exposição de Eduardo Freitas “Não puxe o gatilho“ | Cisterna do Colégio do Espírito Santo
18h30 - Ciclo Artes não é comigo! | “Pedra Rude ou Obra de Arte?” com Pedro Fazenda | Jardim antes do Claustro principal do CES
“Não puxe o gatilho” é uma reflexão escultórica sobre fronteiras, migração e pertencimento. As peças da exposição colocam o público no alvo dos questionamentos de uma política migratória que regula documentos, territórios e corpos. Na primeira pessoa e na voz de terceiros, o artista atravessa fronteiras físicas e simbólicas, entre países e identidades, explorando a tensão entre visibilidade e invisibilidade, movimento e estagnação. A metáfora das pedras e das suas partículas em erosão revela a força do gesto mínimo e a inevitabilidade da transformação: pequenos movimentos podem se propagar. Entre a ausência do corpo do artista na exposição e a sua viagem ao Brasil, os trabalhos conjugam memória, deslocamento e resistência, questionando quem controla, quem observa e quem tem permissão de atravessar.
Público-alvo ou alvo público
Em 16 de julho de 2025, a Assembleia da República de Portugal aprovou um pacote legislativo que incluía a criação da Unidade Nacional de Estrangeiros e Fronteiras, uma força policial com atribuições para fiscalizar documentos, deter pessoas em situação irregular e conduzir processos de expulsão. No entanto, antes da promulgação, o pacote foi submetido ao Tribunal Constitucional, que, em 8 de agosto de 2025, declarou inconstitucionais partes significativas da proposta. Contudo, a UNEF foi sancionada e entrou oficialmente em operação em 21 de agosto de 2025.
E eu — estou no alvo.
Atiro a primeira pedra para falar na primeira pessoa e também na voz de terceiros. Escrevo numa mistura de português e de uma escrita inventada, que me é própria e não pertence nem a um lado nem a outro. Vou atravessar fronteiras: dos países e de mim mesmo, deixando de um lado uma parte do corpo, enquanto a outra segue no território que ainda tento chamar de meu. Saio sem saber se a porta estará aberta no meu regresso - nem para mim, nem para os outros milhares imigrantes atingidos por uma falsa “aima” branca. Ainda assim, à distância e sob o alvo, faço-me presente enquanto o meu trabalho se aponta como a minha principal arma de defesa.
Quem nos irá revolver a pedra da entrada (…)?
Percebi que a pedra não é totalmente impenetrável. Nem é tão opaca que nos impeça de ver o outro lado. Há milhares de anos, na sua silenciosa erosão, ela liberta partículas que se deslocam pelo mundo, lembrando-nos que até os corpos invisíveis não deixam de se mover pelo espaço. E, se os menores movimentos podem se propagar, quem poderá impedir as montanhas de se moverem ou as muralhas de ruírem ao longo do tempo?
Nesta exposição, a entrada é permitida sem necessidade de autorizações especiais, mas só depois de se passar as barreiras e de se colocar diante da mira.
Eu, em viagem para o outro lado do Atlântico, tentarei levar escondidas no bolso algumas pedrinhas, esperando que, com sorte, atravessem os controles de segurança. Então, poderei espalhá-las pelo meu país, deixando que também possam encontrar um novo lugar.
Enquanto isso, uma outra pedra - bem maior, mais pesada - permanece diante da fronteira.
Évora, Setembro de 2025
A poucos dias da viagem ao Brasil
Eduardo Freitas - imigrante em trânsito
Criação: Eduardo Freitas
Produção: Pó de Vir a Ser
Parceria: Universidade de Évora