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O Coletivo Casa Amarela (CCA) é hoje um dos nomes mais consistentes e inquietos da cena experimental portuguesa. Fundado há mais de uma década, o projeto cresceu entre edições, concertos e colaborações, tornando-se uma plataforma que não só lança música como cria contextos para a sua escuta. O ciclo Jejum, que desde 2021 ocupa a Rua das Gaivotas6 e outros territórios, tem sido uma das faces mais visíveis desta atividade curatorial, afirmando-se pela ousadia e pela diversidade estética. À conversa com Bruno Pereira e Mafalda Melim, membros do coletivo, revisitamos o percurso do CCA, a relação entre curadoria e política, o futuro da música eletrónica e experimental em Portugal, e os desafios de manter uma prática cultural independente e resistente.
Como nasceu o Coletivo Casa Amarela e qual tem sido a sua missão desde o início?
Nasceu há 11 anos da vontade em criar uma plataforma que servisse para agregar os nossos projectos, musicais e não só, tanto do ponto de vista editorial como promocional. A nossa actividade foi semi-regular até o verão de 2019, altura em que nos focamos em ter uma presença muito mais assídua na cena experimental portuguesa. No total são 43 lançamentos, de artistes nacionais e internacionais, e cerca de uma centena e meia de eventos, desde concertos, performances, instalações, etc.
De que forma o CCA se posiciona dentro da cena cultural e musical portuguesa atual?
De forma independente, com uma actividade muito regular baseada numa posse alargada de amigues e conspiradores. Há sempre espaço nesta Casa para pessoas que queiram começar um diálogo ou uma colaboração, desde que alinhadas com os nossos valores inalienáveis.
Qual é o papel da curadoria na vossa prática artística e política?
A curadoria, juntamente com a edição, é o foco principal da nossa prática artística e política. São estas escolhas que representam as nossas ideias e o mundo que queremos ajudar a criar.
Como surgiu a parceria com a Rua das Gaivotas6?
A parceria surge de um convite do Pedro Barreiro, antigo director da Rua das Gaivotas6 e uma das pessoas que mais apoiou o projecto desde sempre. Inicialmente o convite era para ocuparmos a RDG6 durante um fim-de-semana, em 2020, e a nossa proposta incluía uma rave, uma série de sleeping-concerts, e várias performances. A pandemia impediu que conseguíssemos avançar com esse projecto, mas o Pedro tratou de nos convidar para um ciclo regular, a que chamamos de Jejum. Daí em diante foram 37 eventos, entre Lisboa, Castelo Branco e Montemor-o-Novo.
O ciclo Jejum já existe desde 2021. Que evolução tens observado na resposta do público e dos artistas ao longo dos anos?
Acho que o ciclo está consolidado junto do público que tem algum tipo de interesse por música experimental ou electrónica. É engraçado perceber que algumas pessoas vieram a quase todos os concertos. O tipo de curadoria faz com que as propostas se consigam destacar facilmente dos outros eventos dedicados à electrónica experimental. Com o passar do tempo foi ficando mais fácil ter mais pessoas nos concertos e chegar a artistes que anteriormente não teríamos hipótese de convidar para tocar.
Como é feita a seleção dos artistas para o ciclo Jejum? Que critérios orientam as vossas escolhas?
Temos em conta dois ou três factores, mas o principal é mesmo muito simples - só convidamos artistes que queremos ouvir e com quem estejamos alinhados politicamente. É importante que estejam a tocar regularmente, que tenham algum tipo de material novo a promover, que não toquem cá muito regularmente (no caso dos artistes estrangeiros) ou que seja uma encomenda específica da nossa parte (no caso dos artistes portugueses, como o Grupo Coral de Autotune ou a colaboração Hocus, Doroteia e Tiago Biscaia) ou uma estreia (tantas, como Vile Karimi, Alma Penada, por ex). Interessa uma ideia de intensidade, de intransigência, que ultrapasse os géneros ou cânones musicais, e sentimos isso tanto nos concertos que programamos de noise mais violento como do ambient mais celestial.
Este ano há várias estreias em Portugal. O que significa para vocês trazer estes nomes pela primeira vez ao país?
Estas estreias são muito importantes para consolidarmos a nossa visão e ambição, e mostrarmos o qu ão é fácil, ainda para mais numa cidade como Lisboa, com tanta oferta tão diversificada. No entanto, diríamos que estamos a conseguir manter a bitola lá em cima, e renovar o projecto sem perder a identidade.
A programação deste ano abrange artistas de estilos bastante distintos, do ambient ao noise e emo. Como lidam com essa diversidade estética?
Apesar dessas diferenças na abordagem, ou diferenças estéticas, existem valores comuns a todos os projectos que escolhemos. Diria que todos estes projectos estão constantemente à procura de algo novo, num gesto próprio, original. É inevitável que pessoas que ouvem muita música diferente façam uma curadoria que reflicta isso mesmo.
O que destacarias como momento imperdível nesta edição?
Todos os eventos são especiais por vários motivos, cada um à sua maneira. Penso que terminar o ano com Vanessa Amara, um projecto que seguimos há muito, vai ser o final perfeito para este ano de programação. Ainda por cima é uma banda editada por uma plataforma que respeitamos e com quem colaboramos há muitos anos, a dinamarquesa Posh Isolation, que encerrou operações justamente com a edição de ‘Café LIFE’, o último disco de Vanessa Amara.
Em 2024, o Jejum saiu de Lisboa. Há planos para expandir novamente para outros territórios em 2026?
Sim, temos uma série de novos parceiros fora de Lisboa, a que se juntam as parcerias que estreamos em 2024 - o Singular, em Castelo-Branco, e o Espaço do Tempo, em Montemor-o-Novo. Ainda é cedo para falar sobre isto, mas em 2026 o Jejum vai ser 50% em Lisboa e 50% pelo resto do país, de norte a sul.
Qual é a vossa estratégia para atrair novos públicos para propostas mais experimentais?
Não há um grande segredo, a ideia é a mesma desde início - queremos oferecer uma programação honesta, inovadora, guiada por valores estéticos e políticos, sem cedências. Muitas vezes são propostas arriscadas, ou desconhecidas, mas esse risco faz parte. Há quem confie em nós e goste de vir à descoberta; há quem saia a correr nos primeiros minutos de determinado concerto, como já aconteceu. Faz parte; seria muito estranho se de repente fossemos capazes de agradar gregos e troianos.
Como vês o futuro da música eletrónica e experimental em Portugal?
É fácil perceber que existe muito talento e muita vontade de criar, basta pensarmos no salto de qualidade que houve nos últimos 12, 15 anos. Ao mesmo tempo, não nos parece que exista o devido acompanhamento por parte das promotoras, instituições culturais ou festivais mais estabelecidos, que estão focados numa mão cheia de nomes e pouco mais. O nosso papel também é esse, possibilitar, à nossa escala, experiências, estreias até, e dar espaço a quem está a começar e não teve - por vários motivos - espaço para mostrar o seu trabalho.
Enquanto coletivo, sentem que a vossa prática também é uma forma de resistência cultural?
Sem dúvida alguma. Aliás, tanto resistência cultural como política, obviamente. Não temos interesse nenhum em ‘chover no molhado’ e alinhar com lógicas destrutivas e capitalistas e também temos muito pouco interesse em alinhar com propostas híbridas no domínio gentrificador-experimental, a cidade já sofre demasiado com isso. O nosso interesse é dar espaço a novos artistes, acompanhar o seu crescimento e ajudar com concertos e edições, o que for necessário, sempre dentro da música experimental, quase sempre electrónica. E, ao mesmo tempo, ter atenção ao que de melhor se faz nestes domínios por essa Europa fora. Este tipo de resistência é cada vez mais importante, especialmente numa Lisboa completamente descaracterizada, onde os espaços dedicados à cultura desaparecem a um ritmo vertiginoso. Felizmente não estamos sozinhos. Cada um de nós tem que fazer o que conseguir para criar o futuro que quer viver, colectivamente.
Que papel tem o apoio institucional, como o da Direção-Geral das Artes, na concretização de projetos como o Jejum?
O papel da Direção-Geral das Artes é fundamental, e é importante que exista. É pena que a cultura não tenha mais condições e mais apoios, é horrível ver a lista de projectos apoiados pela DGArtes e perceber que muitos amigues nossos ficam de fora, apesar de terem trabalhos muito válidos. No nosso caso, este apoio possibilita que possamos pensar a curadoria com mais tempo e condições.
Foto: © Frederico Brízida
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