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Pedro Faro: “A arte e a academia são fundamentais para combater preconceitos”

Por

 

Pedro Mendes
October 6, 2025

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Pedro Faro: “A arte e a academia são fundamentais para combater preconceitos”

Entre setembro e novembro, a Reitoria da Universidade NOVA de Lisboa acolhe Uma Densa Nuvem de Amor, um projeto curatorial de Pedro Faro que propõe um diálogo intenso entre arte, academia e pensamento queer. Ao longo de quase um mês e meio, mais de vinte artistas apresentam obras, performances, filmes, palestras e workshops que instigam novas formas de pensar e sentir o mundo, a partir da densidade e da força transformadora do amor.

A exposição, organizada pelo Programa NOVA Cultura em parceria com o Gabinete de Igualdade e Inclusão, parte de uma pesquisa sobre a produção académica da Universidade NOVA em torno das questões LGBTQIA+, desdobrando-se numa programação que combina reflexão, celebração e experimentação.

Conversámos com Pedro Faro sobre as origens deste projeto, o significado do seu título poético, a relação entre arte e conhecimento, e o modo como uma “nuvem de amor” pode tornar-se um gesto político e estético no espaço universitário.

Como nasceu a ideia de “Uma Densa Nuvem de Amor” e o que quiseste propor com este título tão poético e evocativo?
Este projeto surgiu de um convite da NOVA Cultura, da Universidade NOVA de Lisboa, no início do ano, para pensar numa exposição de arte contemporânea que se relacionasse com o universo lgbtqia+ ou queer.

O título surge da leitura do livro “Queer”, de W. Burroughs, particularmente de um parágrafo que tenho citado em diversas ocasiões e desde há vários anos entre amigxs: 

"I had a duty to live and to bear my burden proudly for all to see, to conquer prejudice and ignorance and hate with knowledge and sincerity and love. “WHENEVER YOU ARE THREATENED BY A HOSTILE PRESENCE, YOU EMIT A THICK CLOUD OF LOVE LIKE AN OCTOPUS SQUIRTS OUT INK" (o caps é meu).

“Uma Densa Nuvem de Amor” procura, assim, questionar o papel da Academia e da Arte na produção de conhecimento, problematizar as relações entre poder e conhecimento, e apresentar momentos de inquietação e reflexão académica, artística, poética, celebrativa.   
  

A programação articula artes visuais, performance, cinema, palestras e até workshops. O que te interessava nesse cruzamento de linguagens e formatos?
Desde logo mostrar algumas hipóteses de reflexão, criação, projeção e performatividade queer, no âmbito artístico/académico. Ou seja, valorizar, ao longo de quase um mês e meio, todas semanas, a situação do encontro entre público, arte e academia. Estas várias obras/situações interpelam, relacionam, instigam a produção do saber (e seus habituais procedimentos).  Esta Densa Nuvem de Amor pretende ser uma pequena hipótese de trabalho, experiência, reunião, discussão, certamente incompleta, mas que procurará provocar outros diálogos entre arte e academia no âmbito das questões lgbtqia+.

Como sabemos, a não-conformidade é um valor fundamental no discurso artístico e para uma efetiva mudança social. O trabalho de artistas e de muitxs académicxs, cheio de densidade e complexidade, é fundamental para abordarmos seriamente os imensos desafios de sobrevivência e coexistência, colocados pela atualidade, de um modo mais sustentado, fundamentado, criativo, inspirador, esperando que esta nuvem em forma de amor, a mais bela de todas as nuvens, continue a crescer. A pluralidade de linguagens e formatos é uma consequência dessa tentativa de densidade.

O projeto acontece dentro de uma universidade. Como é que este contexto académico molda ou influencia a proposta curatorial?
O ponto de partida deste projeto foi, desde logo, a própria produção académica da Universidade Nova de Lisboa, desde a sua abertura, em 1973. Ou seja, interessava-me saber o que a Universidade NOVA de Lisboa produziu dentro de portas, qual foi o efetivo contributo desta realidade académica específica. Assim, o desafio inicial foi o de perceber que tipo de teses, de artigos, livros e conferências foram surgindo ao longo das décadas sobre as comunidades lgbtqia+. Ou seja, o que fez a Universidade NOVA sobre estes assuntos? Que tipo de conhecimento/ abordagens foram realizadas? Que aspetos foram valorizados?

Uma breve consulta no https://run.unl.pt/ repositório de teses de mestrado e doutoramento, livros, conferências e artigos científicos da Universidade NOVA de Lisboa, usando as palavras-chave, combinadas ou individualmente, "Homossexualidade", "LGBT", "Queer", "GAY", "Transsexual" e “Lésbica”, gera vários resultados. O aumento da produção académica sobre as questões lgbtqia+, e problemas que afetam as suas várias comunidades, é muito significativo a partir do início do século XXI, logicamente acompanhando as grandes mudanças sociais, científicas, culturais e legislativas que ocorreram desde então e que levou a que a NOVA criasse, em 2023, o Gabinete de Igualdade e Inclusão, parceiro neste projeto. Esta produção de conhecimento distribui-se pelas várias faculdades e respetivos institutos de investigação da Universidade NOVA de Lisboa e implica, necessariamente, vários pontos de vista, esquemas críticos, necessidades de saber, e modelos científicos.

Ao longo das suas várias décadas de existência, desde 1973, que a Universidade NOVA de Lisboa, em paralelo com outros organismos universitários congéneres, vem densificando uma nuvem de saber muito específica, desafiando/ derrubando perceções, dogmas e preconceitos, abrindo novas perspetivas, problemáticas e saberes. O mesmo acontece no contexto da Arte, da criação e produção artística contemporânea, nas suas várias frentes ou âmbitos disciplinares: artes plásticas, cinema, vídeo, performance, literatura…

Neste sentido, a intervenção/instalação artística de Horácio Frutuoso (também autor da imagem gráfica deste projeto) procura refletir a multiplicidade da produção académica, ressaltando algumas das suas realizações.

Muitas das obras e momentos do programa partem de uma perspetiva queer. Para ti, qual é a potência política e artística de trazer esta discussão para o espaço da academia?
O âmbito académico e o âmbito artístico são fundamentais para combater preconceitos, para abrir novas perspetivas sobre a vida, para gerar novas questões. A perspetiva queer potencia estes atributos e possibilidades. A academia, nas suas várias faculdades, beneficia muito do trabalho artístico, daquilo que a arte consegue imaginar, propor, questionar.

Podes destacar alguma das obras ou momentos que consideres especialmente desafiadores ou emblemáticos dentro da programação?

Resposta impossível. Cada um dos momentos é desafiador. Cada artista, cada documento, imagem, texto, performance, som, risco…

O envolvimento de artistas de diferentes geografias e linguagens mostra uma grande diversidade. Como foi feito esse processo de seleção?
Tendo em conta os vetores já referidos – densidade, amor, academia, arte, saber, poder - começa pela seleção das obras. Uma obra convoca outra obra e por aí fora. A diversidade que refere é reflexo também daquilo que são os meus interesses e o meu percurso. Este projeto, ainda assim, por via da limitação de espaço e de recursos, peca por deixar muitas outras coisas incríveis de fora. Não tem a pretensão de ser representativo ou universal.

Um dos eixos do projeto é o encontro entre público, arte e academia. Como imaginas que esse encontro vai acontecer na prática?

Na inauguração, por exemplo, aconteceu através de muitas conversas informais sobre o que se viu, e, claro, a dançar ao som do dj set de Alex D’Alva Teixeira. Os encontros sucedem-se de muitas formas, mais e menos protocoladas. A situação das performances, do workshop do Francisco Mallmann, da apresentação de livro, e da exibição de filmes diferentes todas as semanas (segunda-feira), palestra e conferência, permite que estes encontros aconteçam naturalmente, de modo mais e menos formal ou convencional.

“Uma Densa Nuvem de Amor” também resgata memórias históricas através do cinema (com a sessão Queer Lisboa). Que importância tem este gesto de revisitar obras mais antigas no contexto da programação?
O Festival Queer Lisboa tem uma importância difícil de qualificar. É muito, muito, muito importante há muito, muito tempo. É um sítio de conhecimento, de arte, de experiência, de liberdade e de justiça. Esta relação com Festival vem da vontade de contarmos com o seu informado contributo. Os filmes que o Queer Lisboa nos traz densificarão as várias propostas e questões enunciadas neste projeto e fazem o merecido reconhecimento de obras e criadores que são fundamentais na nossa história.

O título fala em amor, mas também em densidade e nuvem. Há aqui uma dimensão afetiva, mas também de complexidade e talvez de incerteza. Como lês este equilíbrio?

A vida das comunidades lgbtqia+ é historicamente marcada por esses vetores, entre outros: amor, densidade, complexidade e incerteza. Mas também são, em parte, esses valores que nos guiam e nos permitem criar, questionar e propor novos modos de ser e sentir. 

Que impacto gostarias que esta iniciativa deixasse, tanto nos estudantes da NOVA como no público mais alargado?

Desde logo, gostaria que esta iniciativa gerasse outros projetos de arte na Universidade Nova, com outrxs criadorxs, curadorxs e propostas no âmbito das temáticas que afetam a vida das pessoas lgbtqia+. Espero, ainda, que este projeto em específico traga novas ideias e possibilidades de investigação, que daqui surjam novos cruzamentos, colaborações entre artistas e académicxs. Finalmente, seria extraordinário que mais pessoas, estudantes sobretudo, passassem a considerar a arte, a produção cultural, a criação como aspetos fundamentais nos seus percursos e nas suas vidas.

Foto: © Paulo Oliveira

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