O projecto #garanteolugar pretende colocar em contacto salas de espectáculo e marcas com o objectivo de garantir a sustentabilidade da programação cultural regular e a manutenção dos níveis de rendimento para a comunidade artística. Conversámos com Raquel Pinhão e Teresa Pinheiro, mentoras da iniciativa. Falou-se sobre o que o projecto envolve, sobre as suas origens e também sobre o futuro.
Antes de mais, como estão a viver estes dias incertos?A trabalhar de casa! Na verdade, e é curioso, este projecto foi construído totalmente online: nenhuma das pessoas envolvidas se encontrou pessoalmente durante todo o processo. Portanto, sim, a trabalhar de casa, a pensar em possíveis soluções para conseguir ultrapassar este período de incerteza da melhor forma, tendo em conta que ambas trabalhamos na área cultural e que, por isso, toda a nossa actividade está a ser muito afectada por tudo o que está a acontecer actualmente. Por outro lado, vemos a incerteza destes dias como um período de oportunidade e o desenvolvimento deste projecto deu um certo impulso de esperança: tal como esta ideia surgiu, outras podem surgir.
Como surgiu a ideia para o projecto #garanteolugar?A ideia surgiu no seguimento da retoma do sector cultural e da reabertura dos espaços de programação artística (salas de espetáculos, cinemas, teatros, entre outros) e na incerteza que isso trouxe: o cumprimento de novas regras, nomeadamente a redução da lotação, traz um grande impacto na receita destas salas. Depois de quase três meses fechadas, muitas não sabem sequer se, a nível financeiro, conseguem abrir.
Tendo em conta a falta de apoios que existe para todo o sector cultural e artístico, que deixou de ter rendimentos assim que as salas fecharam e os eventos foram cancelados/adiados, pensámos que faria sentido pensar numa solução que partisse das salas - e, assim, contribuir para a sobrevivência deste nosso ecossistema cultural. Como optimizar os lugares que não vão ser ocupados?
Ao criar novas ligações entre as marcas e salas de espectáculos de forma a ter lotações esgotadas, não só garantimos que as salas têm viabilidade financeira para abrir mas também para manter a sua programação e assim remunerar equipas artísticas e técnicas.
Resumidamente, como funcionará a iniciativa?Tanto as salas como as marcas podem contactar-nos através do nosso site
http://www.garanteolugar.pt. O nosso trabalho assenta na mediação entre as salas, que nos disponibilizarão informações sobre o espaço e programa, e as marcas, que também funcionam de acordo com os seus próprios orçamentos. Faremos o acompanhamento da criação de acordos e a negociação, sempre em comunicação com os dois lados. A implementação passará sempre pela assinatura de contratos de apoio entre salas e marcas, através do quais as segundas adquirem os lugares não ocupados para os espectáculos já programados ou pensados pelos responsáveis das primeiras. Claro que cada caso é um caso e o resultado final será sempre adaptado à especificidade de cada um.
Qualquer sala que acolha Cultura poderá participar?À partida e, de acordo com as medidas em vigor actualmente, apenas as salas com lugares marcados podem abrir ao público. Mas estamos sempre interessadas em falar com todas as salas porque mesmo que não haja uma solução imediata, podemos sempre pensar, em conjunto, em alternativas para o futuro.
Este é um projecto em que todas as partes ganham?Completamente. No fundo, estamos a desafiar as marcas a tomar uma posição e a assumir uma responsabilidade que é apoiar a cultura - tal como o público mantém a responsabilidade de comprar bilhetes e de ir ao teatro, cinema, concertos. Esta associação, principalmente num período como este, acrescenta muito valor à marca e tem muito retorno em termos de comunicação e de visibilidade da marca enquanto impulsionadora da oferta cultural com uma acção tão simples mas muito real e imediata. As salas mantém a possibilidade de programar artistas e espectáculos, contribuindo para a continuidade e para a diversidade de programação cultural e artística em Portugal. É importante sublinhar que o #garanteolugar só funciona se tanto as salas como as marcas tomarem uma posição e participarem no projecto.

Raquel Pinhão e Teresa Pinheiro
Qual o vosso plano a médio prazo? O projecto esgota-se com o fim das restrições nas salas?O nosso plano prende-se inicialmente na mediação entre estes dois agentes - espaços culturais e marcas - que se podem entreajudar de formas muito simples. Isto aplica-se num período urgente e de emergência como agora, mas que pode muito bem funcionar no futuro.
Como antevêem o futuro próximo do sector cultural e dos seus trabalhadores?Infelizmente, antever é especialmente difícil desde que começámos a planear as nossas vidas de quase duas em duas semanas. Esta crise revelou muitos problemas estruturais do sector, mas a verdade é que juntou muitos trabalhadores e uniu-os no protesto e na procura de respostas e soluções. Nós esperamos e acreditamos que o #garanteolugar é um dos caminhos para essas soluções e que, tal como este projecto, surjam outros que juntem esforços para que a retoma das actividades culturais e artísticas aconteça o mais rapidamente possível.